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Superação de Obstáculos: A História de Aline Gobato e o Câncer de Mama


Eu descobri o câncer quando tinha 33 anos. Hoje, estou com 36. Eu estava amamentando meu filho de cinco meses na época e agora, meu terceiro filho tem duas filhas pequenas.

Eu fui fazer um exame pós-parto e era um exame errado, na verdade, porque estava na festinha de mercado para fazer o ultrassom de mama. Três meses depois que fiz terminar amamentação, na confusão de três filhos, eu fui e fiz todos os exames, inclusive este, e foi diagnosticado um módulo pequeno, de mais ou menos um centímetro. Eu não sabia o que era nódulo, e para mim, câncer era uma coisa muito distante. Quando o médico falou “olha, tem um nódulo, você precisa investigar”, eu não sabia o que era nódulo, mas o médico explicou que precisava retirar.

No máximo 15 dias ele já estava operando e retirando da minha mama esse módulo. E eu precisava parar de amamentar imediatamente. Este foi um dos momentos mais difíceis para mim porque o Rafael, meu terceiro filho, era um bebê que amava muito. Mas chegou um dia que eu olhei para ele e falei “Rafa, por algum motivo você me escolheu para ser sua mãe, então me ajuda agora com essa força”. E eu falei para ele “você precisa de uma manhã inteira, não mamãe capenga, meu peito produzia leite e não pôde amamentar”.

15 dias depois, eu já estava na mesa de cirurgia para fazer um quadrante. Aí, era um câncer bem agressivo em função da minha idade. O médico, o oncologista, orientou fazer um pacote completo das quimioterapia, então eu fiz 16 quimioterapia, sendo 4 vermelhas e 12 brancas. Eu tinha um cabelão bem comprida e eu não queria cortar antes, eu não queria não vê o processo desde o começo eu comecei a encarar assim “bom, tudo bem, eu não tenho o que fazer. Eu só tenho como participar do processo.”.

E parece que nesse momento eu juntei todas as forças que eu tinha para canalizar o final do tratamento. Quando eu fiz a primeira quimio, as enfermeiras avisaram que até 20 dias pudesse cair o cabelo, e de fato ele começou a cair. Aí, até que chegou um dia que eu vi que estava caindo muito. Então, chamei minhas filhas e foi em vão cortar o cabelo da mãe. Não quer um corte de cabelo bem linda, então, desci as tesouras pra ela, liguei uma música. Fomos no quintal de casa e elas foram cortando, cortando. E elas estavam se divertindo. Então, eu abri espaço para esse novo começar. Eu sempre fui uma pessoa muito vaidosa com o cabelo. Aí, finalizou, meu marido raspou. Foi bem emocionante, o mais difícil é você olhar no espelho e ver que você está ali dentro porque o careca, na hora de estar bonita, quem era aquela nova pessoa? Porque eu via processo do meu corpo destruição. De repente, o cabelo caiu, a unha sobrancelha, cílios e eu falava “nossa, eu tô aqui dentro ainda”. E era uma força que eu tinha que resgatar pra mim e quem vivia também. Porque quem está olhando de fora fica muito assustado porque quer ajudar e não sabe como e ver a pessoa também nesse processo. O câncer ele vem de uma natureza maligna no sentido de ruim. Realmente, traz muitas despesas, mas depende também do ponto de vista que você olha.

O processo que o câncer nos ensina é este: para tudo na vida, dá pra gente trabalhar e olhar dessa forma, dá pra gente tentar ser protagonista. Eu tenho um problema e só vejo problema, coisa ruim no olhar de outros. Mas do outro ponto de vista, que é o que eu preciso para que eu seja protagonista dessa nova história e escrever algo novo, movimentar essas forças internas que todos nós temos, porque há a lucidez que existe dentro de nós, ela ocupa o mesmo lugar, a força do desânimo, da depressão, diante da imensa escuridão, a nossa luz interna ela aparece.

Eu continuava cozinhando e levando meus filhos na escola e nos dias que me sentia mais cansada, também recuava. Dia que eu não conseguia comer. Na primeira vez que eu fiz, eu fiz assim: “não vou conseguir comer. Vou ficar muito mal”. Eu preciso dos nutrientes, mas eu falei “não, nada posso fazer agora. Eu vou tomar um pouco de água, ver o que eu consigo fazer e, na semana que eu tiver bem, eu vou caprichar na alimentação”. Então, essa foi uma forma de compensar o desespero da possibilidade de ficar mal com uma possibilidade de fazer o que é possível naquele momento. Nada muito grandioso, mas dia após dia.

Foi um ano que eu acho que posso dizer assim, eu não fiquei triste, eu não fiquei chateada porque eu não dei espaço pra isso. E tinha alguns poucos momentos, acho que no ano todo, porque foram seis, oito meses mais ou menos, desde a cirurgia até o tratamento. Em três ou quatro momentos que eu ficava chateada. E nesse momento sete anos, é o que me consome a colher. Era a presença no marido, dos meus amigos. Muitos amigos, mas aquele que conseguia é perfurar a barreira junto comigo. Porque é legal ouvir “senão, ele vai ficar tudo bem. Calma, vai passar. Vai ficar tudo bem”.

Uma vez, uma amiga minha querida falou assim para mim. Na minha primeira quimi, quando eu fiz, eu estava nessa situação que não conseguia comer, me deu um medo muito grande. Passou uma semana, e se passou 45 dias? Passou tudo isso. Eu falei pra ela e falei “nossa, eu estava com tanto medo”. Ela falou “ah, que bom que passou, porque eu também estava com muito medo”. Quem não fica com medo? Ser humano é isso, é ter medo. Bem-vindo ao clube. Todos nós temos medo. Mas, assim, o medo, ele tem um passo para a coragem e a coragem de seguir em frente. E foi esta coragem que, o que se imagina, eu estava com um lenço na cabeça, as pessoas já me olhavam muito, com o bebezinho ainda. Todo mundo olhava com uma cara de sente pena. E não precisava ter pena porque foi uma oportunidade que eu tive para vivenciar essa força interna. Passado todo o tratamento eu fiz os exames, deu tudo certo, e eu estava montando a vida. Falo que eu saí do mundo e voltei para o mundo.


Fonte: Sobre Superar Obstáculos | Câncer de mama – Aline Gobato por TV Oncoguia