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Félix Guattari fala sobre Esquizofrenia: Entrevista legendada em PT/BR 1992

George Veltsos: essa ideia seguramente guattariana de que a esquizofrenia é uma alternativa, que o esquizofrênico no mundo capitalista é alguém que desterritorializa. Podemos ainda entender isso da maneira como se falava em 60-66, sobre essa ideia de esquizofrenia?

Guattari: Mas eu nunca disse que o psicótico ou o esquizofrênico fosse um herói revolucionário, que fosse substituir o líder da classe trabalhadora ou os militantes das fábricas de Putilov de 1917. Eu nunca disse isso. Não, porque às vezes queriam nos fazer dizer alguma bobagem como essa… Simplesmente, o que percebo é que, a relação com o psicótico, por exemplo, em uma clínica como aquela em que trabalho na La Borde faz perguntas com insistência, que geralmente se esforça para não ver, questiona novamente o mundo das significações dominantes, o mundo das relações sociais, o mundo do intercâmbio, o mundo do afeto; introduz com insistência dimensões semióticas e semiológicas que estão em ruptura justamente com este mundo mediatizado, este mundo do poder no qual estamos. De certa forma, é uma espécie de laboratório muito importante.

Então com a psiquiatria, não se importam, a deixam em uma terrível miséria. Eu fui, como você sabe, para a Ilha Leros, onde vi coisas difíceis… Eu fui também visitar os hospitais nos subúrbios de Atenas, que são bastante terríveis de ver. Mas o que vocês fazem com a psicose, com a esquizofrenia? O que vocês fazem com a psiquiatria? A questão que se coloca não é apenas para fazer o bem no campo social… mas: o que vocês fazem com vocês mesmos? O que vocês estão fazendo com sua própria loucura? O que vocês fazem com seu desejo? O que vocês fazem com sua relação com o mundo? Com a sua singularidade? Com o seu nascimento, com a sua morte? Isso é tudo que existe? Não é um objeto que tem importância?

“Oh não, isso não é do nosso interesse, fazemos televisão, fazemos produção, estamos no mercado comum, e a singularidade, a finitude, isso não é nosso projeto”. Ah! Bom, isso me surpreenderia muito, porque apesar de tudo é algo que é o coração da existência. (Imagens do Hospital Psiquiátrico da Ilha de Leros – Grécia)

O problema, em termos diferentes, em um contexto diferente, se coloca para compreender a singularidade do outro… sem entrar em uma relação de identificação ou sugestão. E, então, estar ali, de outra forma, amigo de um processo possível; de um processo que não se refere aos universais da subjetividade, como os complexos freudianos ou os matemas do inconsciente lacaniano. Mas que forja sua própria cartografia, que forja sua própria meta-modelização, e que permite ao indivíduo, seguindo a situação, reconstruir territórios existenciais, onde estava em angústia, em desânimo, o que permite reforjar relações com o mundo, e uma possibilidade de viver.

Portanto, é uma atividade que se pretende não-modelizante e que está muito mais sob a égide de um paradigma estético que um paradigma científico. Uma vez que é uma cura para forjar um trabalho singular.

Tradução e Legenda: Anderson Santos WWW.CLINICAND.COM

Fonte: Entrevista com Félix Guattari: A questão da Esquizofrenia (1992) Legendado em PT/BR por CLINICAND – PSICANÁLISE E ESQUIZOANÁLISE