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TEPT versus violência sexual: sintomas, tratamentos e impactos

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E aí, hoje eu vou falar sobre violência sexual contra a mulher e o que é entendido como violência sexual contra a mulher é qualquer ato libidinoso contra a mulher sem o consentimento dela que seja executado por outra pessoa, em geral por um homem, e isso hoje já é considerado mesmo que sem o ato sexual completo como um estupro.
Aqui no nosso código no Brasil, a violência sexual contra a mulher pode ter consequências bastante danosas para a saúde mental e, especificamente, o quadro do qual vamos falar é o quadro de estresse pós-traumático causado após uma violência sexual.
No Brasil, em 2018, foram reportados 66 mil casos de violência sexual. Então são 180 casos por dia, a cada 12 segundos acontece um estupro no Brasil, e isso é algo extremamente grave que tem consequências muito importantes em saúde pública.
Existe uma pesquisa da Unifesp e da Universidade Federal do Rio de Janeiro em conjunto que mostrou que em São Paulo e Rio de Janeiro pelo menos 45% das mulheres que tiveram episódios de violência sexual acabaram desenvolvendo essa doença chamada transtorno de estresse pós-traumático.
O que é o transtorno de estresse pós-traumático? É uma doença onde a pessoa, após ter sofrido uma situação traumática muito grave, desenvolve uma série de sintomas. O sintoma principal a gente chama de revivescência, que é ter essa memória traumática do que aconteceu repetidas vezes na sua cabeça.
Essa memória vem independente da sua vontade, não é algo que você possa controlar. Você pode estar fazendo qualquer tarefa durante o dia e aquela cena vem na sua cabeça, como se ela tivesse acontecendo de novo. E diante disso, você tem reações muito importantes, como taquicardia, sudorese, aflições e descontroles emocionais. Isso é como se fosse o pânico, não é uma doença do pânico, porque esse sintoma está incluído dentro do quadro do estresse pós-traumático.
Então, além dessa memória intrusiva que a gente chama, que vem sem a sua vontade, você tem essas reações de medo muitas e, muitas vezes, a pessoa fica também hipervigilante. Isso quer dizer que o tempo todo ela está alerta, achando que pode ser atacada novamente. Então ela acaba evitando sair de casa, evitando se expor a situações que lembrem essa violência que ela sofreu. E ela também começa a ter insônia, tem muita dificuldade de pegar no sono, porque são excessivamente comuns os pesadelos que acontecem com a lembrança do que aconteceu. São pesadelos muito violentos onde ela tem essa vivência de que ela sofreu o estupro e isso aparece novamente vividamente em seus pesadelos. Então a pessoa tem muita dificuldade de dormir, ela fica muito agitada e muito alerta.
Por consequência de todos esses sintomas e por lembrar e por ter toda essa dificuldade de retomar a vida, a pessoa acaba tendo também sintomas depressivos. Então ela tem muito desânimo, muita falta de esperança na vida. Ela desconfia das outras pessoas, porque como ela sofreu uma violência de alguém, e muitas vezes principalmente em meninas muito novas e crianças, essa violência é feita por alguém conhecido, isso piora ainda mais essa desconfiança e essa dificuldade de acreditar no futuro, de ter uma perspectiva de vida.
Então vocês podem observar que é uma doença bastante grave, que compromete muito o funcionamento da pessoa. Então, o tratamento para esses quadros vai envolver tanto medicações para diminuir esses sintomas, como medicamentos antidepressivos, são medicamentos que regulam o sono, medicamentos que diminuem esse estado de alerta em que a pessoa vive. Mas também uma psicoterapia, onde a pessoa vai ter que criar um vínculo de confiança novamente e poder expor essas situações de uma maneira que ela possa elaborar e conseguir retomar a funcionalidade da vida que ela tinha antes de ter sofrido essa violência sexual.
No entanto, a gente sabe que metade das pessoas, mais ou menos, que sofre violência sexual vai ter mas existem pessoas que, apesar de sofrerem um evento tão traumático, não desenvolvem a doença. E hoje a gente estuda muito, nós estudamos aqui na Unifesp dentro do PROVE que é o serviço de atendimento e pesquisa em violência e estresse pós-traumático, mulheres que sofreram estupro e desenvolveram quadro, mas também nós tivemos a experiência de poder avaliar pessoas que não desenvolveram quadro de estresse pós-traumático. E através desses estudos, a gente busca entender quais são os fatores de proteção para pessoa não desenvolver a doença.
E a gente sabe que os fatores de proteção são fatores onde a pessoa teve uma vivência familiar tranquila, onde ela foi criada em um ambiente de cuidados, onde ela pôde desenvolver características de defesa importantes. Mesmo que ela tenha sofrido uma situação traumática como estupros na vida adulta, ela tenha apoio familiar e apoio de uma rede em torno dela.
Uma das coisas que a gente também sabe e que acaba dificultando muito isso é que a nossa sociedade ainda é uma sociedade onde o preconceito contra as mulheres que sofrem violência sexual é muito grande, existe um estigma. Então, essas mulheres sentem culpa, elas sentem vergonha e muitas vezes elas acabam não procurando nenhum tipo de ajuda porque o tratamento precoce faz com que elas tenham uma melhora e consigam retomar suas vidas. Mas não procurar nenhuma ajuda só vai fazer com que elas percam essa possibilidade e acaba prejudicando toda uma vida.
Elas não conseguem trabalhar, não conseguem sair de casa, não conseguem cuidar dos filhos. Muitas vezes, essas mulheres são casadas e muitas vezes o casamento termina porque o marido não consegue aceitar essa situação.
Então, a gente precisa ter cada vez mais um processo educativo para que não exista esse preconceito contra a mulher que é, na verdade, a vítima. Ela não é a pessoa que teve culpa de ter acontecido isso com ela, mas o pensamento geral muitas vezes alimenta esse tipo de ideia.
Muitas vezes, quando ela vai ser atendida, tanto no sistema de saúde quanto no sistema policial e no sistema judiciário, a falta de compreensão das pessoas e de preparo para escutar isso e acolher essas mulheres faz com que o fato dela ter que contar várias vezes a mesma coisa e as pessoas às vezes duvidarem do relato dela voltem com maior frequência esse quadro de estresse pós-traumático.
Então, o que mais a gente acredita é que o necessário é um processo educativo cada vez maior para que a gente possa diminuir a violência sexual no Brasil e possa cuidar dessas mulheres. Porque o número de casos, como eu comentei no começo dessa apresentação, é algo muito assustador. 66 mil casos reportados, mas o que se acredita é que como muitas delas não denunciam por conta da culpa e da vergonha, esse número deve ser dez vezes maior. Então seriam 660 mil casos por ano.
E isso só vai diminuir quando a gente conseguir educar a sociedade para cuidar dessas mulheres e cuidar dessa sociedade, e para que os homens não perpetuem esse tipo de comportamento violento.
Fonte: Transtorno de Estresse Pós-traumático (TEPT) x violência sexual por Sua Saúde na Rede