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Como a inflamação pode desencadear a depressão


Olá a todos, meu nome é Fernando Fernandes. Eu sou médico psiquiatra e pesquisador em São Paulo. Você sabia que algumas doenças estão associadas à inflamação cerebral? Essa semana fui surpreendido por uma repórter do Correio Braziliense, que pediu que eu comentasse um estudo que saiu a esse respeito. E eu vou conversar com vocês justamente sobre os comentários que fiz para ela.
Antes de tudo, se você gosta dos assuntos aqui da página do Facebook ou do canal do YouTube, não deixe de se inscrever no canal e curtir a página no Facebook para ser avisado de novos vídeos. Então vamos lá, a jornalista se surpreendeu com o artigo que correlacionava inflamação e algumas áreas cerebrais à depressão crônica. Mas como isso acontece? Existe inflamação no cérebro?
Antes de falar sobre isso, eu queria falar com vocês sobre o outro conceito que existe na neurologia e na psiquiatria, que é o conceito de neuroprogressão. Em muitas doenças em Neurologia e também psiquiatria, a gente sabe que clinicamente vão causando uma deterioração no funcionamento normal da pessoa. E muitas vezes essa deterioração que a doença causa tem um correlato do ponto de vista patológico. O que quer dizer é que ao mesmo tempo que a doença clinicamente vai deteriorando a pessoa, na verdade, a doença está causando também comitante um dano na estrutura cerebral que vai levando a essa deterioração clínica. Essas alterações patológicas e readaptações patológicas que o nosso sistema nervoso central tem que fazer ou que ele sofre é o que a gente chama de neuroprogressão. Pode ser também que é chamado de neurodegeneração, dependendo do contexto.
Os termos neuroprogressão e neurodegeneração são usados para descrever a deterioração do sistema nervoso. Algumas doenças são reconhecidas como neuroprogressivas, como a doença de Parkinson e a de Alzheimer. Mas outras doenças psiquiátricas, como esquizofrenia e transtorno bipolar, hoje são sabidamente neuroprogressivas em alguns casos. E mais recentemente, a depressão crônica tem sido investigada nesse sentido.
Várias alterações que acontecem na depressão crônica são candidatas a possíveis mecanismos de neuroprogressão, como por exemplo, alguns fatores neurotróficos responsáveis pela saúde do neurônio que estão diminuídos na depressão. Já se sabe que algumas substâncias estão aumentadas com a monoaminoxidase e podem estar aumentadas na depressão. A disponibilidade de glutamato pode estar aumentada na depressão. Algumas estruturas cerebrais, como o hipocampo, podem ter o volume diminuído. Aliás, essa alteração é a mais consistentemente encontrada na depressão entre essas que eu falei e sobretudo na depressão crônica, parece que essas alterações aparecem de uma forma mais frequente.
O estudo que essa jornalista me trouxe mostrou que algumas células cerebrais estão ativadas na depressão crônica. Mas as células do sistema nervoso central não são os neurônios, são as células da micróglia, que são células responsáveis por dar suporte estrutural para os neurônios, por fazer a comunicação dos vasos sanguíneos com neurônios e pelas células responsáveis pelo sistema imune, que são parentes distantes dos macrófagos que são células tipicamente inflamatórias. E essas células inflamatórias, quando ativadas, elas liberam fatores de inflamação. Esses fatores de inflamação podem ser úteis em alguns casos, mas cronicamente sempre causam lesão, sempre causam dano. Inflamação crônica é sempre algo que, de maneira geral na medicina, precisa ser controlada.
E também, o que esse estudo mostrou é que o tratamento ao longo dos anos com antidepressivos na depressão crônica parece que está associado com uma diminuição do processo inflamatório nessas três mesmas regiões do cérebro em que foi observada a ativação das células da micróglia. Então, olha que interessante. O tratamento da depressão, que é com antidepressivos, não é com anti-inflamatórios, diminui a inflamação em algumas dessas regiões cerebrais.
Antes de tudo, é preciso dizer que a inflamação no cérebro não é como aquela inflamação que a gente fica quando torce o tornozelo, fica com o tornozelo inchado, ou inflamação na garganta quando a gente tem alguma infecção. É algo bem mais sutil. E como que é detectada essa inflamação? Por que algumas substâncias são secretadas por essas células da micróglia quando elas estão ativadas. E o reconhecimento dessas substâncias nessas regiões faz supor que as células da micróglia estão ativadas. Então, uma ativação inflamatória dessas células é o que acontece no cérebro. Mas vamos ter calma, apesar de isso ser encontrado na depressão crônica, longe da gente poder concluir que a depressão é um processo inflamatório. O que podemos concluir é que o processo patológico da depressão também é um processo inflamatório.
É muito conhecido que uma pessoa em depressão muitas vezes tem desencadeada ou é portadora de algumas doenças inflamatórias, como doença inflamatória intestinal, por exemplo. É aumentada na depressão e outras doenças inflamatórias também. Como eu sempre digo, depressão e outras doenças psiquiátricas não são doenças da mente, nem tão pouco do cérebro. São doenças do corpo todo, e diversas alterações patológicas e fisiopatológicas acompanham as doenças psiquiátricas. São complexas, e assim, elas têm que ser entendidas. Elas têm componentes psicológicos, sociais e biológicos. Compreender as doenças psiquiátricas nessa complexidade pode fazer muito bem para o tratamento e para a evolução dos nossos pacientes.
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Fonte: Inflamação e depressão | Dr Fernando Fernandes por Psiquiatra Fernando Fernandes