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Depressão: 2 características comuns que você precisa conhecer

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Aqui eu quero caminhar com você para falar sobre outro sintoma extremamente comum na depressão: a tristeza. Agora, eu já sei que é tristeza que você vai falar, não vou te falar de tristeza. Não é isso. Um sintoma extremamente comum na depressão é a perda de energia, perda de atividade, de energia. Não só isso, há risco de dizer que a depressão não é tristeza e sim perda de energia. E aí pode acontecer o seguinte: pode acontecer que a pessoa é extremamente ativa, aí ela perde parte da energia dela porque ela está deprimida, mas ela ainda continua fazendo as coisas. Não é que ela não esteja deprimida, é simplesmente que antes ela fazia 100 e agora ela tá conseguindo fazer 60, mas às vezes 60 já é muita coisa porque é uma pessoa ativa.

Então não é porque a pessoa tá trabalhando, não é porque a pessoa tá estudando que ela não pode estar deprimida. Ela pode sim estar deprimida, só que ela consegue fazer as coisas. Mas quando você pergunta para ela, ela vai te contar que ela está precisando e necessitando fazer muito mais esforço do que antes. Ela fazia mais do que isso, ela vai te contar que ela tá demorando mais tempo para fazer as coisas. Antes ela conseguia escrever um texto em meia hora, agora ela demora duas horas para escrever exatamente o mesmo texto. Antes ela acordava, levantava da cama, bom dia não sei quem, bom dia não sei quem, ia lá, escovava os dentes, tomava banho, vestia roupa e nem pensava sobre isso. Agora, na fase de depressão, ela acorda, fica deitada na cama, demora 10 minutos, a mente tentando se convencer: levanta, levanta! Você precisa levantar por isso, para aquilo. Aí a pessoa se levanta, aquela coisa difícil, pesada, chega até o banheiro e fica parado na frente do espelho se olhando durante um tempo, alguns minutos ela fica parada. Aí ela pega a escova de dente, vai escovar os dentes, vai chegar para tomar banho, uma dificuldade tremenda, vai se vestir, uma dificuldade tremenda.

Enquanto isso, já acordando, sentindo emoções negativas e a cognição, o pensamento reforçando aquelas emoções negativas de culpa, de vergonha, de inutilidade, de dor, só emoções negativas o tempo todo. Mas no final, quando você vê essa pessoa três horas depois de acordar, você vê que ela escovou os dentes, você vê que ela tomou banho, você vê que ela se vestiu. O que você não está vendo é o sofrimento que ela teve para fazer exatamente a mesma coisa que antes ela fazia ativamente, nem pensava sobre isso. Durante a depressão, a energia cai, as coisas que antes eram simples começam a ser extremamente pesadas e difíceis, muito mais pesadas e difíceis. Então vamos quebrar, a partir de agora, de uma vez por todas, o mito de que estar deprimido é estar no quarto escuro em cima de uma cama. Esquece isso. Tem um monte de gente deprimida trabalhando, estudando, cuidando da família, fazendo um monte de coisa. Então a pessoa em depressão que tá no quarto escuro em cima de uma cama, essa é uma depressão gravíssima, que a pessoa perdeu tanta energia que ela nem consegue sair da cama. Mas esse tipo de depressão é mais raro. O que frequentemente acontece é que a pessoa faz as coisas, porém está sentindo um esforço muito maior para fazer as mesmas coisas e ela perdeu o interesse pelas coisas, perdeu o prazer pelo que antes ela fazia e agora precisa de mais tempo ou mais esforço para fazer exatamente as mesmas atividades, resultados anteriores.

Então nunca subestime que uma pessoa deprimida pode fazer atividades e até manter uma relativa normalidade nessas atividades.

E agora Renata, será que você vai me contar finalmente da tristeza na depressão? Será que agora é chegada a hora de falar de tristeza em depressão ou não existem outras coisas que estão acontecendo aí em uma pessoa que está deprimida?

Quero te falar de outra coisa frequentemente comum na depressão e não é tristeza, é irritabilidade. A irritabilidade é muito comum durante a fase depressiva. Muitas pessoas têm irritação, ficam mais impulsivas ou têm uma dificuldade maior de controlar seus impulsos. Então pode ser que um homem de 40 ou 50 anos seja super calmo para dirigir, no entanto, quando ele está deprimido, ele toma uma fechada no trânsito, sai xingando todo mundo e perde a cabeça. Por que? Porque agora ele sente de forma muito mais intensa a parte negativa daquela fechada. Não só ele está sentindo mais intensamente, como na cabeça dele ele já criou um cenário completo, cognitivo, para o negativo. Então ele reforçou essa emoção e agora tudo virou uma catástrofe, um drama. Coisas corriqueiras que, quando ele não estava deprimido, não era nada disso, mas agora ele não consegue segurar a impulsividade que vem da irritabilidade, da raiva que ele está sentindo.

Isso é muito comum, principalmente em pessoas que desenvolveram pouco o seu vocabulário emocional, por assim dizer. Nós temos habilidades de regulação emocional que a gente aprende ao longo da vida, a gente aprende a controlar nossas emoções, ou melhor dizendo, a regular as nossas emoções ao longo da nossa infância, da adolescência. A gente aprende isso com os nossos familiares, a gente aprende isso nas escolas, com nossos companheiros de trabalho, ao longo do seu trabalho. A vida é um constante aprendizado de você a regular melhor suas emoções. Algumas pessoas não conseguem aprender isso ou porque não tiveram um ambiente propício e saudável para ter um aprendizado ótimo sobre como regular suas emoções. Então, falta para essas pessoas o vocabulário. Para elas, tudo que elas sentem de negativo é raiva. Por trás daquela raiva se esconde uma grande tristeza. Anota isso daqui, muitas vezes quando você está vendo alguém com muita raiva, provavelmente aquela raiva está escondendo uma grande tristeza que essa pessoa não tem vocabulário para te contar. Então só sai raiva, só sai irritabilidade. E isso é um problema porque raiva afasta as pessoas. Ninguém quer estar perto de alguém com raiva explosiva, e por um bom motivo. Então, pessoas que têm dificuldade, ou porque não aprenderam ao longo da sua vida, não tiveram a oportunidade de aprender o linguajar emocional de regular suas emoções, frequentemente manifestam irritabilidade e raiva quando estão deprimidas.

O que elas gostariam de dizer, caso tivessem um aprendizado e o vocabulário adequado, é que estão tristes, magoadas, é que estão se sentindo muito mal por dentro. Mas como não desenvolveram isso ao longo da vida, por um motivo ou outro, e às vezes o motivo é alheio a sua própria vontade, o que acontece é que manifestam raiva, irritabilidade o tempo todo. Isso é muito comum em pacientes homens deprimidos que, de maneira geral ou culturalmente, não são incentivados a demonstrar a sua emoção com os outros. É aquela famosa cultura de “homem não chora”, nem por dor nem por amor. E aí a pessoa vai reprimir aquele sentimento a vida inteira. E se ele não pode chorar e demonstrar tristeza, o que é que ele vai demonstrar? Ele vai demonstrar agressão e raiva quando ele está dessa maneira. Então, fiquem atentos, fiquem atentos a homens que estão muito explosivos, irritados. É claro que isso também acontece com mulheres, porque se a mulher não desenvolveu o seu vocabulário emocional ao longo da vida e suas estratégias de regulação emocional, ela também vai manifestar através da raiva, da irritabilidade. Mas isso com os homens é mais comum na nossa cultura, pelo menos.

Fonte: 2 CARACTERÍSTICAS COMUNS DA DEPRESSÃO por Dr. Renato Silva